Quintal de Dorlinda
Dorlinda? Quem é? Dorlinda é Dor Linda? Eu?
"Eu nasci de uma Dor Linda. E a minha Dor Linda nasceu no ano da fome, abriu-se de Porteirinha, arranchou-se em Pai Pedro e encruzilhou a vida com meu pai Waldemar, um preto baiano. Os dois eram pessoas em movimento que, como outras, as pretas almas do Quilombo acolheram. Naqueles sertões das Minas Gerais, os acontecimentos eram os marcadores temporais.Daí ela conclui: – Foi no ano de 39, mas pra casar fui registrada de 37. Tenho 78, mas no registro é 80..." (VENTURA, 2021, no prelo).
Dorlinda Ventura, bisavó, avó, mãe, filha de Ursulina encantada e de Mamãe indo-baiana, iniciou-se na pintura no ano de 2015, no meu ateliê, em Fortaleza/CE.
Desd'ai vem compondo séries de pinturas singelas nos temas e formas, ricas nas composições cromáticas, potentes na emanação espiritual, que somente se sente diante da obra em corpo. Dorlinda pinta cores em almas, e suas pinturas abrem-se como bocas reluzentes em risos, risinhos e gargalhos.
Ela, num movimento sankofa, mira longe a reta por onde transitava a misteriosa Luz do Quilombo. A Luz foi-se embora com o povo do Quilombo, no lugar, na encruzilhada onde existiu o povoado onde Dorlinda foi educada no início da formação da sua pessoa, ficaram apenas as marcas, as cicatrizes e as memórias.

Fotografia: Wagner Ventura. Encruzilhada do antigo povoado gurutubano do Quilombo no município de Pai Pedro.
Cores para esperança
O mês de maio convencionado como mês das mães, desde que me entendo por gente, é um mês de celebração e congraçamentos, de encontros.
O maio de 2021 é tristemente excepcional pois como os meses anteriores deste ano é um mês de mortes, violências e desarranjos que atordoa os sentidos e sim, deprime.
Por isso Venturaafroartes.com inicia o desvelamento das obras completas de Dorlinda Ventura com a exposição
Paisagens para um maio de esperança.
A partir de 09 de maio de 2021 até o final do mês congraçaremos algumas das esperanças cromáticas de Dona Dorlinda Ventura.




Fechamos o mês de maio de 2021 com a esperança na superação do morticínio que, de uma forma ou de outra , afeta à todos nós.
As dez pinturas de Dona Dorlinda Ventura apresentadas neste mês foram pintadas em distintos momentos.
São pinturas cuja composição demonstra uma grande capacidade de harmonização das cores na fruição de sensações mobilizadas pelos estados de espírito da artista.
Suas memórias de infância (primeiras fases de formação da pessoa, segundo Tienor Bokar) nas plantações de algodão, no extinto Quilombo da beira de estrada entre Pai e Pedro e Janaúba, no Norte de Minas Gerais; os quintais que ela plantou em Montes Claros, com sua diversidade de seres vivos; enfim, fluem em cores e formas autênticas.
Nesta primeira exposição trouxemos nove pinturas em bandejinhas de isopor e uma em tela.
Esperamos que neste momento de tristezas e isolamentos as pinturas de Dona Dorlinda Ventura aconchegue seus olhos e inspire os apreciadores a trilharem seus caminhos pela pintura.
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Plantação.
Pintura acrílica sobre isopor, 2017
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.
Iniciada na pintura após os 70 anos de idade ela é, sem dúvida, uma fonte de inspiração para quem acha que é tarde para começar.
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Rosa.
Pintura acrílica sobre isopor, 2017.
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.
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Flores.
Pintura acrílica sobre isopor, 2015.
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.
Para Dona Dorlinda, pintar é uma forma de dizer com as cores os sentimentos que palavra alguma expressa.
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Sem Título.
Pintura acrílica sobre isopor, 2017.
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.

Sem título - Estudo de Árvore nº1
Pintura acrílica sobre isopor,
Montes Claros, 2017.
Acervo privado.
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Sem Título - Estudo flores cores nº 1.
Pintura acrílica sobre isopor, 2017.
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.
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Sem Título - Estudo flores cores nº 2.
Pintura acrílica sobre isopor, 2017.
Montes Claros
10CMX8CM.
Acervo privado.
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Sem Título - Estudo flores cores nº 3.
Pintura acrílica sobre isopor,
Montes Claros, 2017.
Acervo privado.
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Sem Título - Estudo flores cores nº 4.
Pintura acrílica sobre isopor,
Montes Claros, 2017.
Acervo privado.
A pintura de Dona Dorlinda, considerando as conceituações estéticas eurorreferenciadas, seria uma pintura naïve (pintura ingênua para os franceses), pintura primitiva ou primitivismo. Artistas que praticam estilos autodidatas, genuínos em cores e formas, geralmente frutos de ricos imaginários sobre o cotidiano, são chamados de Naif, ingênuos ou primitivos.
Esses conceitos na verdade são usados para circunscrever artistas que não se fazem através de formação acadêmica. para categorizar um universo de estilos de arte.
Sobre pintura Naif leia: Freitas, Maria Helena Sassi, 1961- Pintura naïve : conceitos,características e análises, quatro exemplos em São Paulo / Maria Helena Sassi Freitas. - São Paulo: , 2011. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/86976/freitas_mhs_me_ia.pdf?sequence=1&isAllowed=y
